Muito haveria para escrever sobre aquela a que arrisco apelidar da maior companhia de teatro espanhola. As características das suas obras, aliadas à multidisciplinaridade das apresentações transformam um projecto irreverente num verdadeiro poço de criatividade. Dos espectáculos de cenário às óperas, muitos espectáculos compõem o historial da companhia, mas é ao nível dos projectos concebidos em linguagem furera e nos macroespectáculos que a companhia atinge o expoente máximo de notoriedade.
Os La Fura dels Baus nascem em 1979, portanto há 30 anos, traçando desde a sua génese um percurso dominado pela constante evolução e pelas novas incursões a nível das artes cénicas. Nos primeiros anos o projecto dedica-se exclusivamente a teatro de rua, combinando desde logo vários recursos cénicos numa só produção. A maior inovação da companhia passou pela criação de espectáculos muito interactivos, em que de repente o tradicional espaço do público é invadido pela acção. O seu trabalho, desde cedo, se conseguiu adaptar de forma impar ao espaço arquitectónico da acção. Desta fusão de técnicas e disciplinas das artes cénicas nasce a maior característica da companhia: a linguagem furera. É sob este código de elaboração de espectáculos que os catalães se apresentam na edição 2009 do Imaginarius – Festival Internacional de Teatro de Rua de Santa Maria da Feira.
Embora tal já fosse deveras marcante, os La Fura não se ficaram por aqui. Em 1992 a companhia aventura-se num novo projecto: a concepção da cerimónia de abertura dos Jogos Olímpicos de Barcelona. E assim nascia a segunda vertente mais marcante deste projecto: os macroespectáculos.
Ao longo do tempo a companhia soube sempre evoluir e não deixou escapar a revolução tecnológica. Hoje, cada vez mais, presentes nos espectáculos da companhia estão efeitos de projecção multimédia e efeitos visuais e sonoros, que superam os habituais limites da acção teatral.
Na edição deste ano do Imaginarius, os La Fura apresentam “Imperium”, a sua mais recente produção concebida sob o código de linguagem furera. “Imperium” afirma-se como uma abordagem contra todos os tipos de imperialismo. As palavras de Jurgen Muller (fundador dos La Fura) são bem representativas do espectáculo:
«”Imperium” é um convite ao pensamento invertido, a remar contra a maré, a desorientar-se (...), conjugando a energia do nascimento e do enterro. É um lugar destinado a recuperar o prazer da diversidade, a sair do conceito standard».
“Imperium” representa, ainda, um marco histórico para a companhia, inicialmente composta exclusivamente por homens, ao apresentar o seu primeiro espectáculo representado apenas por mulheres.
«”Imperium” é um convite ao pensamento invertido, a remar contra a maré, a desorientar-se (...), conjugando a energia do nascimento e do enterro. É um lugar destinado a recuperar o prazer da diversidade, a sair do conceito standard».
“Imperium” representa, ainda, um marco histórico para a companhia, inicialmente composta exclusivamente por homens, ao apresentar o seu primeiro espectáculo representado apenas por mulheres.
De 28 a 30 de Maio, o Pavilhão da Lavandeira (Santa Maria da Feira) recebe esta brutal produção, sempre às 21h30. Os bilhetes estão á venda, sendo a lotação limitada a 1100 espectadores por sessão.
O espectáculo desenrola-se em 5 actos... as 5 etapas do processo imperial.
O espectáculo desenrola-se em 5 actos... as 5 etapas do processo imperial.
MEDO
O público entra num espaço onde se encontra com o caos... enfrenta o medo. Esta primeira cena invoca na mente do espectador os monstros da sociedade: a morte dolorosa, a impotência, o desânimo, o vício, a ruína material, a insegurança, o terrorismo...
O público entra num espaço onde se encontra com o caos... enfrenta o medo. Esta primeira cena invoca na mente do espectador os monstros da sociedade: a morte dolorosa, a impotência, o desânimo, o vício, a ruína material, a insegurança, o terrorismo...
ORATÓRIAS
Na segunda etapa do processo imperial surgem os discurssos, como antídotos do medo. A activista, a hedonista e a moderadora irrompem pelo espaço criando três câmaras. Dali vão lançando a sua mensagem ao público. Palavras diferentes, embora sempre com a mesma ideia: se vieres comigo, eu tratarei dos teus medos. O espectador tem um período limitado de tempo para escolher em que espaço se quer refugiar. A vida fora das câmaras torna-se impossível.
Na segunda etapa do processo imperial surgem os discurssos, como antídotos do medo. A activista, a hedonista e a moderadora irrompem pelo espaço criando três câmaras. Dali vão lançando a sua mensagem ao público. Palavras diferentes, embora sempre com a mesma ideia: se vieres comigo, eu tratarei dos teus medos. O espectador tem um período limitado de tempo para escolher em que espaço se quer refugiar. A vida fora das câmaras torna-se impossível.
DOMESTICAÇÃO
A terceira fase corresponde à produção de domesticação física e mental. A segurança tem um preço e eis que chegou a hora de o pagar. As instrutoras começam a domesticação do público através do fogo e manipulação do espaço físico. O que antes era um espaço livre está agora transformado num conjunto de vias marcadas pelas instrutoras. O espectador converte-se em “ovelha”, para pagar o preço da segurança.
De seguida, o público volta a encontrar refugio debaixo de uma grande tela, onde se projectam os textos das mensagens de domesticação física e mental, tal e qual o mito da caverna de Platão. A grande tela acaba por cair sobre o espectador, obrigando-o a ajoelhar-se para se poder libertar. A domesticação física chega ao fim com este acto de vassalagem.
A fase final é a auto-censura. Todo o processo de domesticação incluí uma etapa de autodestruição das partes que não querem colaborar. Nesta sequência, as instrutoras destruirão bonecos de palha que confirmam a derrota do inimigo interno: a consciência.
A terceira fase corresponde à produção de domesticação física e mental. A segurança tem um preço e eis que chegou a hora de o pagar. As instrutoras começam a domesticação do público através do fogo e manipulação do espaço físico. O que antes era um espaço livre está agora transformado num conjunto de vias marcadas pelas instrutoras. O espectador converte-se em “ovelha”, para pagar o preço da segurança.
De seguida, o público volta a encontrar refugio debaixo de uma grande tela, onde se projectam os textos das mensagens de domesticação física e mental, tal e qual o mito da caverna de Platão. A grande tela acaba por cair sobre o espectador, obrigando-o a ajoelhar-se para se poder libertar. A domesticação física chega ao fim com este acto de vassalagem.
A fase final é a auto-censura. Todo o processo de domesticação incluí uma etapa de autodestruição das partes que não querem colaborar. Nesta sequência, as instrutoras destruirão bonecos de palha que confirmam a derrota do inimigo interno: a consciência.
CONVERSÃO
Finalmente, atinge-se a etapa da conversão. As instrutoras escolhem as pupilas entre o público para passar à fase seguinte: conversão ou morte. Ao entrar na zona de conversão, as pupilas devem mudar de pele. Esta mudança é também realizada pelo espectador, banhado com areia branca.O culminar do processo imperial é o canibalismo. Desta forma, as pupilas devem comer uma delas. Captura, sacrifício e ritual canibal como prémio para todas as que atingiram o pico do processo, que tem como testemunhas os espectadores.
TODAS MORTAS
Porém, a cadeia de mortes que envolve o processo imperial é infinita. A lei do “olho por olho” só tem um final possível: todas mortas. E assim é, o poder quer mais poder e as pupilas matam primeiro as instrutoras e depois desatam numa guerra fatídica em torno da pirâmide. No final, as duas últimas pupilas realizam entre elas um duelo até à morte.
A última etapa do imperialismo é uma estação onde só há morte e vício. Só resta o vento e o intenso cheiro a morte.
Porém, a cadeia de mortes que envolve o processo imperial é infinita. A lei do “olho por olho” só tem um final possível: todas mortas. E assim é, o poder quer mais poder e as pupilas matam primeiro as instrutoras e depois desatam numa guerra fatídica em torno da pirâmide. No final, as duas últimas pupilas realizam entre elas um duelo até à morte.
A última etapa do imperialismo é uma estação onde só há morte e vício. Só resta o vento e o intenso cheiro a morte.
De referir ainda que a presença da companhia catalã em Portugal não se resume a Santa Maria da Feira. Em simultâneo com o Imaginarius, embora apenas dias 28 e 29 de Maio, os La Fura apresentam-se no Coliseu do Porto, no âmbito do FITEI, com o seu novo espectáculo de cenário Boris Godunov. O mesmo espectáculo será apresentado em Lisboa, no Centro Cultural de Belém de 28 a 31 de Julho.
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